Por Bruna Belasques, Bruno Castro, Gabriel Carneiro, Rafael Abrão e Vitor Hugo dos Santos
Observa-se a persistência de uma dinâmica assimétrica no comércio bilateral, em que a China assume a posição de fornecedor de bens de maior complexidade produtiva e o Brasil se resume à venda de produtos primários. Essa característica foi reforçada durante o surto global de Covid-19
A despeito da recessão econômica mundial resultante das medidas de contenção da pandemia de Covid-19, as relações comerciais entre Brasil e China não apresentaram perdas severas. O saldo da balança comercial entre janeiro e julho de 2020 registrou um valor 6,4% inferior ao mesmo período de 2019. Cabe destacar que em 2009, a China se tornou a principal parceira comercial do Brasil. Foram momentos relevantes nesse processo, a criação do BRICS, em 2006 – juntamente com Rússia, Índia e África do Sul -, do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), em 2014, além do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), em 2004 – embora este tenha sido reconhecido por ambos os países somente em 2015 -, com o objetivo de aprofundar os conhecimentos sobre as relações sino-brasileiras, sua dinâmica comercial e as características dos investimentos chineses no Brasil.
No entanto, o fluxo de mercadorias entre os dois países tem sido marcado por relações comerciais assimétricas. Por um lado, o Brasil exporta, majoritariamente, produtos de baixo valor agregado, como soja, petróleo, minério, carnes e madeira. Por outro, as importações oriundas da China são compostas, em grande medida, por produtos industrializados, entre os quais se destacam maquinário, equipamentos de telecomunicações e produtos da indústria química. Além disso, chama a atenção o fato de alguns dos principais produtos entre as exportações brasileiras serem dependentes de insumos importados da China, como é o caso do adubo necessário para o cultivo de soja.
Críticas empresariais
Essas assimetrias têm suscitado críticas de setores empresariais, especialmente porque a China é reconhecida pelo Estado brasileiro como uma economia de mercado desde 2004. Essa caracterização é alvo de oposição constante por parte de entidades empresariais, particularmente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), cujas críticas concentram-se na suposta prática chinesa de determinar preços reduzidos artificialmente, estabelecendo uma concorrência desigual com os produtos nacionais.
Segundo dados do extinto Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, atualmente incorporado ao Ministério da Economia, de janeiro a julho de 2020, a China manteve a posição de principal destino das exportações brasileiras, tendo sido responsável pela aquisição de US$ 41,3 bilhões de produtos, o que corresponde a 34,1% do total das exportações realizadas pelo Brasil, um valor 15% superior ao mesmo período de 2019. A soja se manteve como o principal destaque, com um valor de US$ 17,2 bi (42% do total), seguida pelo minério de ferro e seus concentrados, com US$ 7,9 bi (19%), petróleo e minerais betuminosos, com US$ 7,3 bi (18%), carnes, com US$ 3,6 bi (8,8%), e, por fim, a celulose, que correspondeu a US$ 1,6 bi (4%).
Expansão de receitas
Neste contexto, ocorreu a expansão de 29% das receitas oriundas da soja, de 17,6% do minério de ferro e de 107,4% entre as carnes. É importante destacar que as empresas chinesas receberam a recomendação para adquirir maiores volumes de grãos e oleaginosas, ampliando seus estoques diante da possibilidade de agravamento da pandemia no Brasil. Quanto ao petróleo, ocorreu um aumento das receitas em ritmo inferior em decorrência da oscilação negativa dos preços da commodity no mercado internacional. Ressalta-se que o volume das exportações de petróleo teve aumento 117,8% em julho de 2020 na comparação anual, alcançando 8,19 milhões de toneladas.
Em meio a pandemia, a China aproveitou os preços baixos para aumentar suas reservas estratégicas e se tornou o destino de 70% do petróleo brasileiro exportado, o que tem contribuído para consolidar o Brasil como um dos principais exportadores mundiais, deslocando tradicionais produtores como México, Venezuela, países da África Ocidental e da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). Em relação à celulose, deve ocorrer uma redução das exportações para a China no segundo trimestre, em decorrência da maior oferta do produto no mercado e dos efeitos econômicos da pandemia.
Similarmente, a China tem se mantido como o principal parceiro comercial entre as importações brasileiras em 2020. Empresas chinesas exportaram ao Brasil aproximadamente US$ 19,3 bi, uma redução de 6,9% em comparação ao mesmo período de 2019. Entre os principais produtos estão plataformas – embora isso tenha ocorrido por efeito da nacionalização de plataformas da Petrobras que operam no Brasil, mas estavam anteriormente registradas por suas subsidiárias no exterior -, embarcações, compostos químicos, equipamentos de telecomunicação, eletrônicos e outros produtos de alto valor agregado.
Dinâmica assimétrica
Em suma, observa-se a persistência de uma dinâmica assimétrica nas relações comerciais sino-brasileiras, em que um país assume a posição de fornecedor de bens de maior complexidade produtiva, no caso da China, e o outro se resume aos produtos primários, como identificado nas exportações do Brasil. Essa característica foi reforçada pela pandemia de Covid-19, conforme observado no aumento significativo das exportações dos principais produtos primários brasileiros e, até o momento, não parece ter sido afetada pelo discurso hostil de setores do governo do presidente Jair Bolsonaro em relação ao país asiático.