Brasil e Venezuela: Política Externa, Democracia e os Olhares da Mídia

09 de maio de 2024

Por Ana Claudia Paes, Bruno Fabricio Alcebino da Silva, Gabriel Gesteira,Isabella Lucino, Maria Eduarda Brito, Mônica Almeida Peña e Ismara Izepe de Souza (Imagem: Ricardo Stuckert/PR)

 

Durante muitas décadas, as relações entre Brasil e Venezuela foram consideradas de baixa relevância, apenas se intensificando notavelmente a partir da década de 1990 e especialmente após os anos 2000. Contudo, nos últimos anos, essas relações têm ganhado destaque tanto entre o público em geral quanto entre aqueles que buscam moldar a “opinião pública”. Este tema é intrinsecamente polêmico, gerando divisões de opinião e destacando o papel dos meios de comunicação na formação da percepção do cidadão comum sobre questões internacionais e aspectos específicos da política externa brasileira.

 

Nos últimos vinte anos, as relações entre Brasil e Venezuela, apesar de sofrerem limitações de integração física relacionadas à localização geográfica, se estruturaram em torno do comércio bilateral, do financiamento à exportação de bens e serviços de engenharia, dos investimentos em infraestrutura e da parceria energética. As dificuldades de integração física entre os dois países se refletiram em desa­fios para as relações bilaterais ao longo do século XX. As cidades fronteiriças fazem parte da região com menos concentração populacional dos dois países. A política regional venezuelana tendeu ao longo das décadas em  ser voltada para o Caribe e pouco voltada para a América do Sul.

A partir do acordo chamado Pacto de Punto Fijo, em 1958, que garantiu a estabilidade democrática no país entre 1960 e 1980, as relações entre Brasil e Venezuela passaram por três fases distintas: i) entre 1958 e 1970, período caracterizado pelo distanciamento do Brasil; ii) entre 1970 e 1980, caracterizado por um processo de aproximação cautelosa e convergência gradual de agendas; e, iii) a década de 1990, caracterizada pela construção das bases de uma agenda mais estruturada de cooperação regional. Na época, a Venezuela se via como um país andino, caribenho e amazônico, com uma política democrática, petrolei­ra,  terceiro-mundista e ocidental, porém isolada de seus vizinhos. Isso afetou sua relação com o Brasil. Em 1964, a Venezuela suspendeu as relações diplomáticas com o país após o golpe militar. No período, além do rompimento, o país venezuelano provocou a OEA a adotar sanções contra o Brasil e outros regimes militares instaurados na região.

Com a consolidação do processo democrático venezuelano, a redução de uma ameaça de agressão externa e a alta do petróleo na década de 1970, a Venezuela procurou diminuir seu isolamento e ampliar sua presença regional, além de buscar uma posição de liderança. Tal fato não ocorreu sem atritos, uma vez que o interesse venezuelano encontrava oposição com as aspirações regionais de Brasil e Argentina. Pelo lado brasileiro e sob o regime militar, o país tinha como objetivo estreitar suas relações com a Venezuela para ampliar suas importações de petróleo, adensar a integração da região amazônica ao restante do país e, ainda, obter espaço para exportações de manufa­turados.

Em 1978, os oito países amazônicos – Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela – assinaram o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), em Brasília. As dificuldades de relacionamento en­tre Brasil e Venezuela se refletiram na demora da Venezuela em assinar o TCA. A iniciativa brasileira gerava desconfianças no país vizinho, já que, pelo ponto de vista venezuelano, a iniciativa brasileira ameaçava seus interesses em suas duas áreas de atuação prioritária: a bacia do Caribe e, de importância relativa menor, a região andina. Nos anos 80, apesar dos dois países terem voltado a se interessar em fortalecer a cooperação regional, as relações bilaterais sofreram um esfriamento, por causa de fatores externos como a desregulamentação do sistema financeiro internacional, os choques do petróleo e as altas taxas de juros nos Estados Unidos. 

A política externa venezuelana foi marcada por uma retração geral e a brasileira por dificuldades decorrentes do contexto internacional. Com o governo de José Sarney (1985-1989), o país buscou se aproximar de seus vizinhos latino-americanos de modo a fortalecer sua posição junto aos países em desenvolvimento e contrapor-se a posturas desfavoráveis dos Estados Unidos em diversas áreas.

Assim, apesar dos poucos resultados concretos, houve uma crescente convergência entre os interesses das políticas externas de Venezuela e Brasil. Dois pontos podem ser destacados: a diminuição do “temor da dependência brasileira” por parte da Venezuela e a atuação comum dos dois países nos processos de paz da América Central em rejeição a uma intervenção militar norte-americana. Os dois países se encontravam em um período de aprofundamento da agenda de cooperação bilateral, de tensão política na Venezuela e de estabilidade política no Brasil, que tinha Fernando Henrique Cardoso em seu segundo mandato (1999-2002), quando Hugo Chávez assumiu o poder, em 1999.

A chegada à presidência brasileira de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), manteve o aprofundamento das relações bilaterais e possibilitou a convergência em temas centrais, como por exemplo: a adoção de uma visão político-estratégica para a América do Sul, o reforço da economia nacional como condicionantes para qualquer interdependência global, a integração sul-americana como condição prévia às integrações mais amplas, o repúdio à presença militar norte-americana na Amazônia e o interesse de não privatizar o setor petroleiro. As visões dos dois países se distanciavam quando o assunto era a estrutura do sistema internacional, as relações com os Estados Unidos, o lugar da América do Sul e as estratégias a serem adotadas. A Venezuela, entre outras coisas, identificava os Estados Unidos como o principal inimigo da “Revolução Bolivariana” e entendia que a integração regional deveria ser fortalecida como forma de contrabalancear os governos norte-americanos e construir alianças geoestratégicas.

Por outro lado, a política externa brasileira não era de confrontação direta com os Estados Unidos. O Brasil mantinha uma relação positiva e cordial com o país, procurando equacionar tal relacionamento com uma atitude propositiva para a construção de um mundo multipolar e a reforma dos organismos internacionais. A partir de 2007 e 2008, os dois países passaram a ampliar as áreas de cooperação para setores como desenvolvimen­to industrial, agrícola e novas iniciativas. Porém, essa cooperação começou a perder impulso entre 2012 e 2014, até cessar em 2015. No início do governo Temer (2016-2018) houve uma postura crítica mais assertiva do Brasil em relação à situação política na Venezuela. Durante o governo Bolsonaro (2019-2022) a política externa brasileira para a Venezuela foi radicalmente alterada. O governo brasileiro passou a considerar o país vizinho como “totalitário” e a associar a Venezuela à “criminalidade”, ao “narcotráfico” e ao “terrorismo”. Essa postura foi modificada em 2023, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu seu terceiro mandato.

As relações Brasil-Venezuela pelos olhos da mídia

A seguir, apresentaremos um panorama e uma breve análise da forma pela qual alguns veículos da imprensa, que representam espectros políticos bem distintos, indo da esquerda governista à extrema-direita, abordaram as relações entre os dois países. Focaremos especialmente em dois momentos: na visita que  Nicolás Maduro fez ao Brasil em maio de 2023 para a reunião da UNASUL (União das Nações Sul-americanas), e nos desdobramentos recentes acerca dos preparativos para a eleição presidencial venezuelana de 2024.

Brasil 247

O portal Brasil 247 desde 2011 noticia os principais acontecimentos do Brasil e do mundo, comprometendo-se, segundo o próprio portal, com a “democracia plena, o desenvolvimento com justiça social, a sustentabilidade ambiental, os ideais progressistas e o multilateralismo da política externa”. Ele é composto, principalmente, por profissionais ligados ao jornalismo progressista, além de contar com colunistas ligados aos movimentos sociais da esquerda brasileira, cujo propósito, segundo o site, é empoderar criticamente seu público e não seus acionistas. 

Quando se trata da relação do Brasil com a Venezuela, o portal tem uma postura comedida, se diferenciando da maioria dos outros veículos de comunicação. Em maio de 2023, o portal acompanhou a cúpula da Unasul e os encontros do presidente Lula com líderes da região, entre eles o presidente venezuelano Nicolás Maduro. Lula abordou propostas para a criação de mecanismos de integração, combate à fome, saúde, educação, cooperação e combate ao crime organizado nas fronteiras. A matéria do Brasil 247 destacou que era a primeira vez que o líder da Venezuela visitava o país em oito anos, já que sua última passagem havia sido  em 2015 para a posse da então presidente, Dilma Rousseff. A visita já havia sido anunciada, alguns dias antes pelo portal,  que olhou com grandes expectativas para o encontro entre os líderes, apoiando-se, ainda, no potencial econômico da relação e nas possibilidades de retomada e expansão das parcerias, “da complementaridade de cadeias produtivas e da remoção de obstáculos ao comércio”. Apesar do jejum de oito anos de visitas ao Brasil, o presidente venezuelano retornou ao país menos de dois meses depois da sua primeira passagem em 2023. Desta vez, para participar  da Cúpula da Amazônia, cujo objetivo era propor ações para estabelecer um “equilíbrio entre a proteção da vegetação e o desenvolvimento econômico e social na região”. Aqui, o portal  também não assumiu postura crítica, mas relembrou a intenção brasileira de retomar as relações com a Venezuela e o desejo de que lá ocorram  eleições democráticas, limpas e transparentes. 

Condizente com isso, em 2024, o presidente Lula e o Itamaraty posicionaram-se contra o impedimento da candidata María Corina Machado em concorrer às eleições na Venezuela.  Lula entendeu o impedimento como um ataque à democracia e criticou as decisões das autoridades venezuelanas de impor barreiras aos candidatos adversários. Ainda, defendeu a necessidade da transparência e do processo democrático nas eleições, reforçando o mesmo posicionamento adotado em 2023. Com isso, as relações entre os dois países ficaram estremecidas. Em nota, o chanceler da Venezuela, Yvan Gil, criticou a postura do governo brasileiro e afirmou que, assim como a Venezuela compreende os princípios diplomáticos de não interferência nos assuntos internos dos demais países, esperava que o Brasil fizesse o mesmo. O Brasil 247, no entanto, não se posicionou de maneira assertiva com relação a essa fala, limitando-se a  noticiar os fatos e seus desdobramentos.

Folha de São Paulo

A posição do jornal Folha de São Paulo frente ao tema “Brasil-Venezuela”  não é de tom acusatório ao país vizinho, como observado em outros meios de circulação. Nas publicações analisadas, a Folha de S. Paulo tem relatado os encontros e as trocas de notas públicas de maneira descritiva, embora não demonstre simpatias à situação política do país vizinho.

Na publicação “Venezuela não quer escalar crise com Lula e define críticas como fato isolado” a jornalista Mônica Bergamo noticiou  que a Plataforma Unitária Democrática (PUD) foi impedida de registrar a professora universitária Corina Yoris como candidata às eleições presidenciais na Venezuela, após a inabilitação de María Corina Machado, favorita nas pesquisas até então. Um dia antes dessa nota , a Folha havia publicado que “Venezuela chama críticas do governo Lula de ‘cinzentas e intervencionistas’”, com a adição de que o “regime de Maduro diz que nota do Itamaraty sobre eleição parece ditada pelos EUA”. Além disso, a colunista destaca que há uma “clara mudança” de tom entre os países em relação às trocas de notas públicas sobre o assunto.

A colunista Mônica Bergamo utilizou palavras como “dura” para definir a resposta do governo venezuelano às críticas por parte do Brasil. Além disso, reiterou que o governo da Venezuela “poupa” Lula e evita o nome do chanceler brasileiro, Mauro Vieira, na nota de resposta, responsabilizando “funcionários de segundo escalão” pelas críticas proferidas. 

Embora a Folha não seja um jornal que manifeste simpatias ao governo de Nicolás Maduro e à forma pela qual o Brasil o trata, o tom das matérias não foi agressivo, tendendo a  transmitir as notícias de forma mais descritiva, utilizando nas matérias  boa parte do discurso dos próprios envolvidos na situação.

Veja

A revista Veja tem se posicionado de forma crítica em relação à situação política da Venezuela, evidenciando uma suposta preocupação com a democracia, os direitos humanos e a estabilidade na região. 

No artigo intitulado “Maduro sobe rampa do Palácio do Planalto para reunião com Lula”, a revista abordou a visita do presidente venezuelano Nicolás Maduro ao Brasil, em maio de 2023. A revista destacou que essa visita acontecia em meio a uma cúpula da Unasul, marcando a retomada das relações bilaterais entre Brasil e Venezuela, as quais foram interrompidas durante o governo de Jair Bolsonaro. A matéria relatou ainda uma cerimônia de assinatura de atos e um almoço em homenagem a Maduro. As reportagens que abordaram a visita de Maduro foram bastante críticas à política externa do governo Lula. A matéria “Lula emperra planos de liderança sul-americana com ode ao ditador”, sintetizou a avaliação da revista sobre as relações entre os dois presidentes. A matéria não só criticou o governo de Maduro, como também reforçou que o governo Lula tendia a adular demais um ditador, ressaltando que a “rasgação de seda” por parte de Lula tendia a enfraquecer os planos brasileiros de liderança na região sul-americana. A Veja também tem se posicionado sobre as próximas eleições na Venezuela. Na matéria “Seja firme, Lula”, que destaca a figura de María Corina Machado como principal oponente de Maduro nas eleições presidenciais, a revista ressaltou a importância de Lula assumir uma postura firme em defesa das liberdades individuais e de parar de dar aval a um autocrata, referindo-se às declarações recentes do presidente brasileiro em apoio a Maduro. Além disso, a matéria enfatiza a necessidade de uma transição negociada para restabelecer a democracia na Venezuela e destaca a importância do Brasil e de outros países da região nesse processo.

O posicionamento de Lula em relação à Venezuela também é objeto de críticas na matéria “Alvo de críticas, Lula volta a citar ‘narrativa’ e defende Maduro”, na qual ele é questionado e acusado de  distorcer fatos sobre o regime de Maduro e de defender uma suposta administração democrática do ditador venezuelano. A revista destaca as críticas de presidentes de outros países sul-americanos e ressalta a importância de construir uma narrativa com base em “fatos verdadeiros”.

Assim, a visão sobre a realidade política da Venezuela na Veja reflete o posicionamento da mídia hegemônica brasileira, que tradicionalmente tende a criticar governos de viés ideológico oposto, especialmente os considerados de esquerda. A revista costuma destacar questões como a falta de democracia, os abusos de direitos humanos e a instabilidade política na Venezuela, associando-as diretamente ao governo Maduro.

Entretanto, é interessante notar uma leve mudança na abordagem da revista em relação ao terceiro mandato de Lula. Nos episódios recentes de críticas brasileiras ao processo eleitoral venezuelano, a revista enfatizou que houve uma mudança de postura positiva do governo, embora tenha atribuído a “correção de rota” não à manifestação do governo brasileiro em defesa da democracia, mas como uma tentativa de aglutinar apoio interno. Enquanto nos mandatos anteriores a revista adotava uma postura de crítica ferrenha à política externa altiva e ativa, atualmente Veja  parece estar mais comedida em suas críticas, talvez refletindo uma adaptação ao novo cenário político brasileiro, tentando se distanciar de uma extrema-direita cada vez mais identificada com o radicalismo. Essa postura de críticas menos efusivas pode ser avaliada também como uma estratégia editorial para se manter relevante junto a um campo da direita não bolsonarista, em um contexto de polarização política acentuada. 

Revista Oeste

A revista Oeste talvez seja hoje o veículo de comunicação que mais representa o pensamento da extrema-direita no Brasil. Ela se auto-identifica como defensora das matrizes ideológicas do liberalismo econômico e do conservadorismo. As lives opinativas no youtube  tendem a comentar os fatos antes de minimamente explicá-los. Todos os comentaristas possuem uma preferência clara pelas políticas do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e desde seu início os fundadores não escondem sua parcialidade, afirmando que os problemas do capitalismo só podem ser combatidos com o capitalismo, que as ideias de esquerda não funcionam e que a realidade é só uma, justificando assim a sua parcialidade. Uma agência de checagem de notícias, a “Aos Fatos”, ganhou permissão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) para  indicar alguns conteúdos da Oeste como falsos (as notícias em questão estariam  promovendo desinformação sobre a Covid-19 e as  queimadas na Amazônia). 

Sobre as relações com a Venezuela, as críticas sobre a condução da política externa do Governo Lula para esse país sempre foram eloquentes. Sobre a visita de Maduro ao Brasil em maio de 2023, os comentaristas da Oeste, em um recorte de um trecho de uma live padrão da revista no Youtube chamada “Oeste sem Filtro”  criticaram o fato de um  “Ditador” ser recebido com honras de Chefe de Estado e afirmaram que apesar de ser normal no pragmatismo e nas relações internacionais haver diplomacia com ditaduras, não é isso que o Governo Lula estaria realizando. O Governo Lula estaria, segundo a Oeste, “louvando” o governo Maduro visto como o equivalente atual a Fidel Castro, por ser  a maior referência “socialista” atual. Com isso os comentaristas querem expressar a ideia que o Governo Lula não só corrobora com as medidas antidemocráticas de Maduro como também almeja se assemelhar ao governo dele.

A comentarista Ana Paula Henkel destacou fatos comuns da narrativa bolsonarista, como a suposta censura do Tribunal Superior Eleitoral a jornalistas, não os deixando abordar as “amizades” de Lula com ditadores. Como pode se  verificar ao longo desse texto, isso pode ser claramente contestado, pois outros veículos de informação também foram críticos à política externa do Brasil para a Venezuela e não foram alvo de censura. A reclamação se estendeu também à fala de Lula de que Maduro deveria criar sua própria “narrativa”, o que foi interpretado  como um incentivo de Lula  à mentira. A referida comentarista também aproveitou o ensejo para criticar a destruição causada pelo que ela considera ser o “socialismo” de Maduro, citando fatos anteriores ao regime atual, como desemprego, PIB entre outros, porém sem base acadêmica ou de pesquisa econômica, realizando comparações entre dados de anos distintos da Venezuela, entre eles alguns da década de 1970, sem qualquer  explicação mais contextualizada. Ou seja, uma tentativa clara de explicar dados recentes a partir de outros de enorme  distância histórica.

Em outro vídeo mais recente,  que também é um recorte de um momento da “Oeste sem Filtro”, o comentarista Alexandre Garcia criticou a reunião bilateral de Lula com Maduro no âmbito da reunião da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e ironizou o presidente Lula por, em sua avaliação,  ignorar a questão da Guiana. O articulista, porém, se perde, desvia de assunto, deduzindo de uma fala de Lula na reunião, na qual  condenou a condução da Guerra contra o Hamas por Israel, que o país estaria conduzindo uma aliança global junto ao Irã contra Israel. Nesse mesmo vídeo a comentarista Ana Paula Henkel que fala  a seguir, concorda com Garcia, também ressaltando uma parceria entre Maduro e Lula para 2026 e batendo na tecla da suposta censura à imprensa acerca das relações de Lula com “ditadores”. Com isso, a Revista Oeste  procura projetar Lula como  líder de uma grande associação de países “malignos”.

Ao observar uma série de matérias presentes no site virtual da Revista Oeste, percebemos que mesmo diante de críticas do Governo Lula às eleições Venezuelanas, os comentários da mídia de extrema-direita continuam firmes contra o presidente Lula. O governo afirmou em março de 2024,  que “acompanha com expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral na Venezuela”, algo que Caracas classificou como intromissão influenciada pelos EUA. A seguir, Lula comentou a proibição de María Corina, comparando com sua trajetória pessoal, quando foi proibido de disputar, mas teve Haddad como representante, declarando que era “grave” o fato de a substituta de María, Corina Yoris, não ter conseguido se registrar. Segundo a Revista Oeste esse foi um momento de contraponto no histórico de relativizações feitas por Lula ao seu “aliado”, Nicolás Maduro, que é classificado como ditador sempre que a revista o cita. Por fim, em uma reportagem que noticiou que parlamentares do PT assinaram uma carta a favor das eleições da Venezuela, a Revista Oeste os acusou de ignorar a miséria, fome e perseguição que são consequências do governo de Maduro. 

Considerações finais 

As relações entre Brasil e Venezuela, que por muitas décadas foram consideradas de baixa relevância e só vieram a se intensificar na década de 1990 e após os anos 2000, nos últimos anos ganharam atenção do grande público em geral e de quem busca influenciar a opinião da população. O retrocesso das relações entre os dois países durante os governos Temer e Bolsonaro encontrou amplo apoio na mídia, pois boa parte dos veículos classificam Maduro como um ditador. Através da observação  das notícias sobre  a visita de Maduro ao Brasil em maio de 2023 e sobre as eleições venezuelanas, pudemos observar as posições de diferentes veículos de mídia. 

Enquanto o Brasil 247 e a Folha de São Paulo mantiveram tom mais neutro, a postura ofensiva quanto à condução da política externa do Governo Lula veio das revistas Veja e Oeste, reconhecidas pelas suas posições mais à direita do espectro político. No Brasil 247, o foco foi trazer os fatos às notícias, sem tomar nenhuma posição de elogio ou crítica às ações do governo Lula, mas ressaltando nesses fatos as propostas e intenções do presidente brasileiro nas reuniões multilaterais que ocorreram. A Folha de São Paulo, veículo reconhecido por representar majoritariamente o campo da  direita, projetou opiniões de colunistas que também têm suas reservas quanto ao futuro das relações do Brasil com a Venezuela. No campo mais crítico, temos em primeiro lugar a Revista Veja, que cobra de Lula uma postura mais assertiva contra a Venezuela, destacando que o presidente brasileiro teria um papel como líder regional para garantir a estabilidade e, por isso, deveria defender a democracia e as liberdades individuais no país vizinho, sem corroborar com as atitudes de Nicolás Maduro. À despeito de uma postura mais moderada da revista em outros temas relacionados ao governo Lula, se comparado às gestões petistas anteriores, quando o tema é a Venezuela, a revista continua a elevar o tom, sendo um dos maiores representantes da mídia hegemônica que enquadra o governo Maduro como ditatorial. Finalizando nosso portfólio de veículos de informação, temos a revista Oeste, na qual as críticas às políticas de Lula mas também à sua pessoa são feitas abertamente. É um veículo representativo da extrema-direita e, diferente da Veja ou da Folha, é caracterizado por não ter compromisso com os fatos, dando ênfase à opinião dos comentaristas que apresentam muitas vezes informações aleatórias para aparentar que falam com alguma credibilidade. É um veículo que frequentemente flerta com a desinformação, o que leva a discursos sem sentido que se afastam do tema original da notícia. Não podemos nos esquecer que essa revista é uma das mais consolidadas na formação da opinião no campo da extrema-direita.

Como podemos observar, as relações Brasil e Venezuela se constituem em um tema polêmico, que divide opiniões, sendo representativo da forma pela qual os veículos de comunicação atuam para influenciar o cidadão comum a ter uma determinada visão sobre os fatos internacionais e sobre aspectos específicos da política externa brasileira.

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