O novo governo Lula e as relações Brasil-Estados Unidos e Venezuela

14 de junho de 2023


Por Ana Carolina Carvalho de Oliveira, Camila Micheletti Flores, Fernanda Messias Moretti, Gabriela Fernandes Nabuco de Araujo, Marina Tedesco Alvarenga, Patricia Lima Rego e Tatiana Berringer (Imagem: Ricardo Stuckert/PR)


Presidente Nicolás Maduro visita o Brasil após oito anos, marcando a reaproximação entre os Estados e gerando controvérsias. A visita ocorreu a convite do presidente Lula e busca restabelecer o relacionamento econômico e político entre os dois países. A reconstrução da UNASUL também é discutida durante encontro com líderes sul-americanos. Críticas da imprensa internacional e brasileira levantam preocupações sobre a postura de Lula em relação a Maduro. Especialista destaca a importância do diálogo sem interferência nos assuntos internos dos países.


Depois de oito anos, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, voltou ao Brasil. À convite do presidente Lula, a visita do dia 29 de maio de 2023, foi marcada pela reaproximação dos dois Estados que desde o golpe de 2016 haviam se afastado.  


Isso porque, desde o início da Revolução Bolivariana, com a eleição de Hugo Chávez em 1998, o Estado venezuelano se tornou um peça central das relações hemisféricas, e, em especial, das relações Brasil-Estados Unidos. Tendo em vista que a Venezuela foi o primeiro país a apresentar um programa contra o neoliberalismo e colocar-se contra a ALCA. Soma-se ainda o fato do país ser um grande produtor de petróleo, muito mais próximo do que o Oriente Médio. Com isso, as tentativas para desestabilizar o governo Chávez e Maduro foram muitas.


Entretanto, o papel do Brasil na manutenção da estabilidade regional e da defesa da autonomia e da não-intervenção é historicamente fundamental. Em 2002, após a primeira tentativa de Golpe contra Chávez, abriu-se uma grave crise de abastecimento no país vizinho. Com FHC presidente e Lula recém eleito, mas não empossado, o Estado brasiliero liderou a criação do grupo “Amigos da Venezuela” (um conjunto de Estados que garantiram o abastecimento de alimentos e bens necessários para a população venezuela sobreviver).  Depois disso, seguiu-se o aprofundamento das relações bilaterais com cooperação energética e aproximação das iniciativas de integração regional que resultaram na criação da UNASUL em 2008, que se configura como uma organização internacional , que tem como objetivo integrar e fomentar a relação dos países sul-americanos, integrando o Mercosul e a CAN para além do âmbito econômico, sem a presença dos EUA. Dessa forma, os doze Estados sul-americanos, pela primeira vez na história, decidiram pelo seu próprio destino.  E, além disso, contariam com a aliança que o Estado brasileiro estava firmando com o grupo BRICS. 


Foi então que começaram os golpes, desestabilizações e novas eleições de governos que novamente se subordinavam passivamente ao imperialismo estadunidense e que adotavam políticas neoliberais, a exemplo da Argentina em 2015 e do Brasil em 2016. Esse cenário propiciou para que a crise humanitária e a crise política na Venezuela se intensificassem, sobretudo depois das sanções econômicas adotadas pelos Estados Unidos. 


Com isso, em 2017 a UNASUL foi abandonada e no lugar dela criaram-se iniciativas que tinham como objetivo se contrapor à Venezuela: o Grupo de Lima e o Pró-Sul. 


Após as eleições venezuelanas em 2019, os EUA incentivaram um novo golpe, e reconheceram como presidente interino Juan Guaidó, que foi prontamente apoiado pelo  governo Bolsonaro.  Dessa forma, os EUA seguiram a ofensiva adotando uma série de sanções econômicas contra a Venezuela, que foram flexibilizadas após a invasão da Ucrânia, devido à necessidade dos EUA e da Europa de acesso à energia. 


Por isso, a visita de Nicolas Maduro ao Brasil foi  um marco de retomada do relacionamento econômico e político entre os dois Estados fronteiriços, conforme divulgado na nota conjunta. Dessa forma, o encontro entre os dois presidentes ocorreu com a finalidade de debater os problemas que cercam seus países. Com isso, embora o presidente Lula tenha enfatizado as dificuldades que cercam a relação entre Venezuela e Brasil, principalmente a respeito da dívida externa, Lula reverbera que o governo brasileiro buscará uma “integração plena” para que os dois países possam estreitar os laços. Além disso, a reunião serviu para que Lula e Maduro assinassem memorandos de entendimento na área agrícola, além de um mecanismo de supervisão da cooperação bilateral. Posteriormente a essa reunião, no dia 30 de maio, Lula e Maduro se reuniram com os demais presidentes da América do Sul com o objetivo de reconstrução da UNASUL, que havia sido abandonada anteriormente. 


Como efeito,  a partir não só da visita de Maduro ao Brasil, mas também por sua participação frente a reconstrução da UNASUL, surgiram críticas pela imprensa estadunidense como pela imprensa brasileira ante a essa aproximação. O jornal The Washington Post publicou um artigo provocativo intituladoBrazil ‘s Lula promised to save democracy”. Why is he embracing Maduro? , criticando Lula por priorizar a geopolítica em detrimento das questões cotidianas que afetam a população. Ou seja, na matéria, Daniel Zovatto, diretor do Instituto Internacional para a Democracia e a Assistência Eleitoral, afirmou que a visita representa a “oficialização do retorno do regime autoritário de Nicolás Maduro à região”. Além disso, outros veículos estadunidenses importantes, como o The Economist, também expressaram preocupações. No artigo intitulado Lula cosies up to Nicolás Maduro, Venezuela ‘s autocrat. Brazil’s new president appears to be motivated by ambitious plans for foreign policy,  duras críticas são feitas às declarações de Lula, apoiando-se nas posições dos presidentes Lacalle Pou (Uruguai) e Gabriel Boric (Chile). Já a imprensa brasileira, ecoou a narrativa exacerbada dos EUA, acusando Lula de receber um ditador. Outrossim, veículos jornalísticos como “O Estado de São Paulo” e a “Folha de São Paulo” criticaram a recepção de Lula ao presidente Venezuelano.  


Contudo, embora tenha reverberado de maneira negativa a aproximação da Venezuela não só com o Brasil, mas frente a UNISUL, principalmente exercidas pelos EUA e pelos veículos que apoiam a relação EUA-BRASIL, para Regiane Bressan, especialista em integração da América Latina e professora de Relações Internacionais da Unifesp, infere por meio do podcast “Café da Manhã” que a aproximação entre Brasil e Venezuela não indica o rompimento com a democracia, mas que se configura como uma espécie de bandeira de paz.


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