Por Ana Paula Fonseca Teixeira, Gabriel Soprijo, Emerson Hilário e Tatiana Berringer
As relações Brasil-Estados Unidos estão pautadas por dois grandes temas: um acordo comercial almejado pelo lado brasileiro e a disputa em torno do acesso à tecnologia 5G que coloca o Estado brasileiro no seio do conflito entre Estados Unidos e China. O primeiro parece enfrentar resistências internas nos Estados Unidos, que se revela pelo relatório do Comitê Interno do Congresso publicado na primeira semana de julho de 2020. O segundo parece apontar para uma nova triangulação na política externa brasileira, mas, a estratégia do governo não tem sido a busca por equidistância ou barganha.
A questão do 5G: uma nova triangulação na PEB
Em novembro de 2019, executivos que coordenam as operações da empresa Huawei na América Latina se reuniram com o presidente Jair Bolsonaro para se aproximarem do governo. Após a reunião, o presidente afirmou que não aconteceu uma proposta concreta, entretanto houve a demonstração de interesse em instalar o 5G.
A empresa chinesa atualmente está em uma guerra comercial com Washington sobre quem vai liderar a tecnologia mundialmente e sofre acusações de espionagem por parte dos EUA, sendo considerada uma ameaça para a segurança nacional dos países. O Gabinete de Segurança Institucional (GSI), publicou um documento com requisitos de segurança cibernéticas, em 27 de março. No dia 24 de junho, as tensões ganharam novas proporções, quando o governo Trump, em nota divulgada pela embaixada de Brasília, afirmou que o Estado brasileiro deveria se contrapor à vigilância do Partido Comunista Chinês. Apesar disso, o Estado brasileiro parece ter a intenção de seguir com a negociação para não ficar de fora do acesso às inovações nesta área e prejudicar o povo brasileiro, o que indica certa neutralidade ou pragmatismo do lado brasileiro em relação ao conflito Estados Unidos e China.
Acordo comercial Brasil-EUA 2020: o retorno do fantasma da ALCA?
Ambicionando beneficiar-se da aproximação dos dois presidentes, no início de maio, a Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a U.S. Chamber of Commerce enviaram uma carta conjunta aos Estados brasileiro e estadunidense, endossada por mais de 25 instituições empresariais. No documento, pleiteia-se o prosseguimento e assinatura do acordo comercial, em negociação desde o ano passado, entre os dois países, reivindicando a necessidade de tratamento de áreas como facilitação de comércio, boas práticas regulatórias, combate à corrupção, comércio eletrônico, propriedade intelectual, entre outros temas que representam um primeiro passo para um acordo comercial mais abrangente. Além disso, nota-se a urgência – manifestada na carta do setor privado – apresentada pela situação instável em que tanto o Brasil quanto os Estados Unidos se encontram. Receia-se o fim do momento de aproximação, desconsiderando todo o trabalho feito em direção ao acordo. Nos EUA, as futuras eleições presidenciais, que ocorrem em novembro deste ano, detêm um pleito imprevisível. Já no Brasil, as crises que atravessam as esferas política, econômica e social são uma iminente ameaça a à estabilidade do governo.
Congresso americano desiste do casamento com o governo Bolsonaro
Na segunda-feira, 6 de julho, começou a circular no Congresso americano um documento disponibilizado pelo CRS (Serviço de Pesquisa do Congresso — sigla em inglês), responsável por informar deputados e senadores de assuntos tratados nas duas casas e de formular relatórios, como é o caso do documento escrito por Peter J Meyers, especialista em assuntos latino-americanos. O relatório que tem como título “Brasil: histórico e relações com os EUA” (disponível em: https://crsreports.congress.gov/product/pdf/R/R46236), apresenta um panorama que em nada se parece com o discurso do Itamaraty encabeçado pelo chanceler Ernesto Araújo, que exalta as relações com os Estados Unidos.
O relatório externa pelo menos cinco alertas aos congressistas estadunidenses que indicam as resistências para a discussão sobre um acordo comercial e as relações bilaterais mais umbilicais. São eles: as ameaças à democracia brasileira, dificuldades no enfrentamento à pandemia do coronavírus, a política ambiental, o baixo crescimento econômico e os entraves comerciais entre os dois Estados.
Em relação à democracia brasileira destacam-se os conflitos internos e o enfrentamento do governo com alguns aparelhos do Estado, como o STF, a mídia e organizações não governamentais. Destaca-se também a influência dos filhos do presidente no debate político (como as declarações de Eduardo Bolsonaro sobre a China) e as participações da família em atos antidemocráticos. O documento ainda demonstra preocupação com o enorme número de militares ocupando pastas no governo, que é o maior número desde a ditadura militar.
Sobre a economia chamam a atenção para o baixo crescimento econômico e para a mudança na política externa, desde 2014. Além disso, enfatizam que, segundo Confederação Nacional da Indústria (CNI), o aumento das taxas americanas sobre o aço e alumínio poderão impactar em US$ 1,6 bilhão por ano as exportações brasileiras.
No que tange à política ambiental enfatizam que as medidas de combate e controle têm diminuído e parecem caminhar para o desmantelamento dos órgãos de monitoramento, o que indica possibilidade de sanções.
Ao concluir o relatório, percebe-se um conjunto de ressalvas em relação à aproximação mais estreita com o governo brasileiro.
Fontes:
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-50468237