O Brasil diante do BRICS e do Novo Banco de Desenvolvimento

Por Bruna Belasques, Bruno Castro, Gabriel Carneiro, Rafael Abrão, Vitor Hugo dos Santos e Ana Tereza Marra

Diante do alinhamento da Política Externa Brasileira (PEB) com os EUA e as tensões que ora se arrefecem, ora se intensificam nas interações com a China, as relações do Brasil com o BRICS e com o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) no governo Bolsonaro estão sendo marcadas, de um lado, pela perda da importância estratégica do BRICS dentro da PEB, e, por outro, pelo aumento da importância do NBD como alternativa para acessar recursos financeiros

O BRICS

Apesar de o termo BRIC ter nascido em 2001 como forma de referenciar quatro economias emergentes – Brasil, Rússia, Índia e China – como oportunidades para o mercado financeiro, em 2006 ele passou a ter conotação política com a ocorrência dos primeiros encontros entre os Estados, à margem da Assembleia Geral da ONU, para discutirem possibilidades de aprofundar a cooperação entre eles. A partir de 2009, como reflexo direto das dificuldades de governança internacional provocadas pela crise de 2008, o BRIC passou a realizar reuniões anuais de cúpula, fazendo do agrupamento importante instrumento de pressão para reformas financeiras e monetárias nas negociações no âmbito de G20. Em 2011, a África do Sul passou a integrar o agrupamento, constituindo-se assim o BRICS.

Desde as primeiras cúpulas, diferentes propostas de cooperação foram desenvolvidas entre os países, abrangendo mais de 30 setores – entre os quais estão ciência e tecnologia, promoção comercial, energia, saúde, inovação e combate a crimes transnacionais. Além destas cúpulas entre chefes de Estado, dezenas de outras reuniões, compostas por ministros, altos funcionários e técnicos são realizadas anualmente.

Para a PEB, durante os governos Lula e Dilma, o BRICS foi entendido como uma importante plataforma para a projeção do país, uma vez que contribuía para que o Brasil representasse assuntos na arena internacional, como a necessidade de reforma nas instituições internacionais, a defesa de maior espaço para os países em desenvolvimento, dentre outros, respaldado pela força de grandes países de outros continentes, sendo três deles potências nucleares. Assim, apesar das diferenças existentes entre os países do BRICS, para o Brasil tal iniciativa foi catapultada para elevar a voz do país no mundo e ajudar na defesa de aspectos que já estavam presentes na PEB, como o direito ao desenvolvimento.

O NBD

Durante a VI Cúpula, realizada em 2014, em Fortaleza, duas instituições do âmbito financeiro foram criadas pelo BRICS, o Arranjo Contingente de Reservas (ACR) – que possui como objetivo “assegurar a liquidez para enfrentar crises na balança de pagamentos dos países membros”, visando a garantia da estabilidade financeira destes Estados – e o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD).

O objetivo do NBD foi estabelecer novos instrumentos de financiamento para fomentar projetos de infraestrutura. Os membros do BRICS assumiram um compromisso inicial equivalente a US$ 100 bilhões, dos quais 41% correspondentes a recursos da China, além de 18% de Brasil, Índia e Rússia, e os 5% restantes da África do Sul. Em sua resolução, o banco prevê a possibilidade, em um horizonte de médio e longo prazo, da entrada de novos Estados-membros e da concessão de empréstimos para países que não compõe o BRICS. Os empréstimos são fornecidos após a apresentação e aprovação de um projeto, sendo assim necessário que um ente público ou privado busque financiamento.

O Brasil diante do BRICS e do NBD e a pandemia

Desde o início do governo Bolsonaro, aprofundou-se na PEB uma característica que já era tendência no período Temer: a de tratar o BRICS a partir de uma perspectiva eminentemente economicista e pragmática. A visão de que o agrupamento poderia servir como plataforma para a inserção internacional brasileira e contribuir para que o Brasil reduzisse as assimetrias de sua inserção, foi substituída pelo alinhamento com os EUA na gestão de Ernesto Araújo.

Contudo, o NBD, enquanto braço pragmático do BRICS, foi mantido como objeto de atenção do governo brasileiro pela sua potencialidade como fonte de recursos para o país. Tal fato, todavia, esbarrou nas dificuldades, em meio ao desmonte do BNDES e de instrumentos nacionais de desenvolvimento, de apresentar projetos que pudessem concorrer a recursos. Como resultado, até julho deste ano, o Brasil era o país que tinha acessado menos recursos do NBD, tendo a situação se modificado só por causa pandemia.

Em 2020, a atuação do NBD tem sido, inevitavelmente, pautada pela pandemia do coronavírus. Essa conjuntura, a qual angariou ainda mais atenção para a China, suscitou que o Banco construísse uma agenda de financiamentos voltada ao combate ao vírus.

Em retrospectiva, a empreitada do banco contra o Covid-19 se iniciou em 19 de março, com um empréstimo de 7 bi de yuans para financiar políticas de saúde pública de algumas províncias da China. Em abril, o NBD realizou uma reunião, na qual o Brasil foi representado pelo ministro Paulo Guedes, para emitir uma nota explicitando a vontade e o empenho do banco de coordenar esforços contra a pandemia. No mesmo mês, foi emitido à Índia um empréstimo de US$ 1 bi também voltado a financiar gastos de saúde pública.  Aproximadamente dois meses depois, em junho, a África do Sul recebeu US$ 1 bi visando o mesmo objetivo. 

O Brasil, por sua vez, foi beneficiado com um empréstimo em julho, no mesmo montante dos outros países, sendo que os recursos estão voltados para o pagamento do auxílio emergencial. A tabela seguinte sistematiza o histórico das ações voltadas ao combate do Covid-19 por parte do NBD.

Alguns setores do empresariado brasileiro, como a Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB), defenderam os investimentos do NDB e de outros bancos multilaterais para “reconstruir” o país após a crise do Covid-19. Estes investimentos, segundo a ABDIB, deveriam ser voltados para projetos de infraestrutura – de modo resumido, cabe apontar que há, na economia heterodoxa, uma tendência em apontar o efeito “crowding-in” dos investimentos públicos em infraestrutura; isto é, a capacidade de determinados gastos públicos do governo estimularem investimentos do setor privado e, assim, reaquecendo a economia. Este é o caso de projetos de infraestrutura, os quais tendem a gerar grande números de empregos, alta arrecadação e, em alguns casos, ganho de competitividade.

Marcos Troyjo, recentemente empossado presidente brasileiro do banco, emitiu uma declaração alegando que, até 2025, há uma promessa de um ciclo e empréstimos de até R$ 11 bilhões para o governo brasileiro e entidades subnacionais com o intuito de colocar o NBD como protagonista no processo de retomada e expansão econômica pós-pandemia.

Além dos projetos relacionados diretamente à pandemia, neste ano, o NDB também aprovou algumas propostas de financiamento de infraestrutura. Um deles é direcionado ao Brasil, dedicado à aprimoração do sistema educacional do município de Teresina. 

Assim, percebe-se que, em meio à crise do Covid-19, o NBD tem sido um importante ator para auxiliar no combate a pandemia, inclusive flexibilizando suas premissas sobre apenas financiar projetos de infraestrutura. No caso brasileiro, isto é notável pela colaboração com empréstimos para o pagamento da Renda Básica. Já as possibilidades futuras de fomentar aportes destinados a projetos de infraestrutura a fim de impulsionar a retomada econômica do país, para concretização, dependerão da capacidade nacional de propor projetos de desenvolvimento.

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