Comitê da ONU aponta graves violações dos direitos políticos de Lula

16 de maio de 2022

 

Por Camila Batista da Silva, Julia Alves Guerra e Gilberto M. A. Rodrigues (Foto: Unsplash)

 

O Comitê de Direitos Humanos da ONU, formado por especialistas em direitos humanos e direito internacional, concluiu que o processo criminal conduzido pela Operação Lava a Jato, que condenou o ex-presidente Lula a doze anos e um mês de prisão, violou “seu direito de ser processado por um juiz imparcial, seu direito à privacidade e seus direitos políticos”, segundo garantias do devido processo legal previstas no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, um dos pilares do regime internacional de direitos humanos. 

 

Após quatro anos da primeira manifestação – e determinada a inocência do candidato à presidência perante as acusações até então protocoladas – o Comitê manifestou-se apontando as violações ocorridas e solicitando que qualquer nova atualização na investigação seja feita em termos legais e constitucionais, de forma a prevenir, também, que casos semelhantes aconteçam. 

 

De acordo com os advogados de Lula, cabe ao Estado encontrar maneiras de reparação às violações de direitos políticos direcionadas ao candidato à presidência, que atualmente lidera as pesquisas de intenção de voto para presidente e que nos últimos anos confrontou diversas acusações, duas condenações e “580 dias de prisão injusta”, de acordo com o relatório emitido pelo órgão da ONU. O relatório lançado em  28 de abril solicita que o Estado informe o que será feito com relação à sua declaração em até 180 dias

Como funcionam as recomendações do Comitê de Direitos Humanos da ONU  

O Comitê de Direitos Humanos da ONU foi criado em 1976 com o objetivo de supervisionar o cumprimento do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, de 1966. No período da criação do Pacto o Brasil vivia seu período ditatorial, aderindo apenas no ano de 1992. Composto por 18 especialistas voluntários, isto é, não remunerados, o órgão recebe e analisa reclamações individuais ou generalizadas, como um grupo de pessoas.  No caso do ex-presidente, a queixa foi uma reclamação individual. 

 

As recomendações do Comitê não têm caráter vinculante, ou seja, não são mandatórias. No entanto, em se tratando do âmbito político, as recomendações de caráter internacional são fortemente simbólicas, haja vista que o desrespeito a tais tratados acabam por demonstrar uma falta de compromisso, e, por conseguinte, geram desconfiança. Em outras palavras, o não cumprimento afeta diretamente a reputação do país.  

 

Tratando-se especificamente da decisão perante ao ex-presidente, não há mudanças palpáveis no âmbito jurídico, uma vez que todos os processos protocolados já foram anulados, arquivados ou encerrados. No entanto, partindo de uma perspectiva política subjetiva e simbólica, a decisão do Comitê se reflete nas eleições de 2022 no Brasil e na imagem de Lula dentro e fora do país, tornando-o um ator político ainda mais forte e respeitado. Em contrapartida, a imagem do ex-juiz Sergio Moro, pré-candidato a cargo ainda não definido, fica abalada pela decisão do Comitê da ONU, que o declarou parcial (uma das piores acusações que um juiz pode receber sobre o exercício das suas funções). Em sua autodefesa perante a opinião pública, Moro declarou que o Comitê da ONU foi levado a erro pela posição do STF que, na sua visão, errou ao anular os processos contra Lula. Trata-se da opinião de quem, após condenar Lula, renunciou à magistratura e aceitou ser Ministro da Justiça do Presidente Bolsonaro, fato que gerou inevitável suspeita, não apenas sobre sua parcialidade funcional, mas igualmente ética e moral.  

Relembrando o caso

Lula foi condenado a partir de acusações de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, por meio de uma Operação de investigação anticorrupção iniciada em 2014, durante o governo de Dilma Rousseff: a Lava Jato, comandada pela figura do então juiz federal Sérgio Moro. O caso envolveu acusações, julgamentos, condenações, anulação de condenações e absolvições, e durou cerca de seis anos. Durante este longo período, ocorreram desdobramentos muito relevantes no cenário político nacional, dentre eles, o impedimento de candidatura de Lula à presidência, em 2018  e, posteriormente, a reversão de tal decisão por parte do Supremo Tribunal Federal, que apontou falhas no processo jurídico, tornando Lula novamente elegível e inserindo-o mais uma vez no jogo político eleitoral em 2022.

 

As irregularidades cometidas pelas decisões de Moro não foram observadas somente em âmbito nacional: o processo que condenou o ex-presidente chegou às mãos do Comitê de Direitos Humanos da ONU, acionado pela defesa de Lula em 2016 para que realizassem uma análise dos respectivos acontecimentos e decisões judiciais. O Comitê se manifestou inicialmente em 2018, ano da prisão de Lula, argumentando que todos os direitos políticos do ex-presidente deveriam ser garantidos pelo Estado brasileiro “até que todos os recursos sobre sua condenação tenham sido completados em procedimentos judiciais imparciais e sua condenação seja definitiva”, o que não ocorreu. 

 

Dentre as violações cometidas contra Lula, o Comitê citou a irregularidade na condução coercitiva, a autorização de divulgação de conversas telefônicas e mensagens, o impedimento arbitrário de sua candidatura à presidência em 2018, e, amarrando todas as anteriores, a parcialidade do então juiz Sérgio Moro, que conduziu o processo.

 

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