Investimentos do Novo Banco de Desenvolvimento no Brasil

01 de agosto de 2024

 

Por Audrey Andrade Gomes, Bruno das Chagas Ramos e Ester Gonzalez de Souza (Imagem: Ricardo Stuckert/PR)

 

Com a posse de Lula na presidência do Brasil em 2023, houve uma mudança relevante, se comparada com a de Bolsonaro, em relação à Política Externa Brasileira (PEB). Pode-se notar isso com a reaproximação do Brasil com o BRICS, maior engajamento internacional e os novos acordos firmados que trouxeram mais investimentos ao país. Com essa nova PEB, o Novo Banco do Desenvolvimento (NBD) ganhou novos ares e perspectivas e, em casos como a catástrofe no estado do Rio Grande do Sul, tornou-se uma peça chave para investimentos em solo brasileiro.

 

Neste ano, comemoram-se os 10 anos de criação do NBD e do Arranjo Contingente de Reservas (ACR) criados pelo BRICS e que foram mais detalhadas nesta análise do OPEB. O NBD, conhecido popularmente como “Banco do BRICS”, exibe-se como uma instituição de crédito de baixo risco e alta capacidade de pagamento, classificado pela Fitch e S&P como AA+. Além disso, com a entrada de novos membros (Bangladesh, Emirados Árabes Unidos e Egito), a instituição bancária conta com 35% do PIB e 45% da população global, com um orçamento de aproximadamente 56 bilhões de dólares. Os seus projetos para financiamento e o alinhamento com interesses nacionais dos membros chamam a atenção frente aos bancos multilaterais tradicionais.

 

O NBD no Brasil

 

Os investimentos do NBD no Brasil passaram a ser mais significativos após a crise sanitária causada pela COVID. Em dois anos (2019-21), o montante foi duplicado, conforme pode ser observado no gráfico abaixo. Antes disso, o Brasil chegou a ser o país que menos recebeu recursos do Banco

 

Fonte: IPEA 

 

Durante a pandemia, o NBD fez algo inédito ao conceder financiamento emergencial de 10 bilhões de dólares para todos os países do BRICS, a fim de mitigar os impactos gerados pela COVID-19 – no caso do Brasil, uma metade dos recursos (US$ 1 bilhão) foi utilizada para pagar o auxílio emergencial, enquanto a outra foi aplicada pelo BNDES para socorrer o setor empresarial. Como resultado, a carteira de financiamentos do NBD entre 2019 e 2021 saiu de US$ 14,4 bilhões para US$ 29 bilhões. Entre outros projetos financiados pelo NBD, destacam-se o do Estado do Pará e o da Petrobrás, com financiamentos de US$ 50 milhões e US$ 200 milhões, respectivamente.

 

Apesar de a maior parte dos projetos do NBD com o Brasil ser voltado a diferentes atores (municípios, outros bancos de desenvolvimento, estados da federação, setor privado, instituições financeiras), em termos de valores, observa-se que há uma concentração de 80% do valor dos desembolsos para o BNDES e União. A Associação Brasileira de Municípios (ABM), sabendo disso, durante o 1º encontro do Urban20, levantou o debate “[…] a gente acha que é importante que os municípios tenham acesso ao banco que é um novo mecanismo de financiamento internacional”. Nesse mesmo dia, a fundação da Associação de Cidades e Municípios do BRICS aconteceu, associação essa que pode ser um mecanismo facilitador na concessão de empréstimos do NBD para os municípios brasileiros, colaborando na neoindustrialização brasileira e na infraestrutura de municípios, incluindo aqueles que foram destruídos pelo desastre do estado do Rio Grande do Sul.

Ajuda financeira ao Rio Grande do Sul 

 

Após a tragédia climática que devastou o Rio Grande do Sul afetando mais de 2 milhões de pessoas e resultando na morte de mais de 130, o Vice-Presidente e Ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, e a presidente do NBD, Dilma Rousseff, anunciaram ajuda financeira de aproximadamente 5 bilhões e 750 milhões de reais para o estado afetado. A carta-compromisso referente ao empréstimo foi assinada e oficializada durante viagem oficial do vice-presidente à China.

 

Em vídeo publicado em sua conta oficial no X, Dilma Rousseff afirma que “o Banco do BRICS tem um compromisso e vai atuar na reconstrução e na recuperação da infraestrutura do estado”. O total disponibilizado será liberado diretamente através de parcerias entre o NDB e instituições financeiras nacionais:  Banco do Brasil, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul).

Os bancos de desenvolvimento cumprem com sua função de fornecer créditos para investimentos destinados ao desenvolvimento socioeconômico da sua área de atuação. O BNDES, com sua atuação federal, tem como principais atividades: financiamento de empreendimentos, formulação de projetos de concessões públicas e de parcerias entre setor público e privado, auxílio ao governo na formação de políticas públicas e produção de conhecimento para a área da economia. O BRDE, sendo um banco de desenvolvimento do setor regional, tem como função fornecer subsídios necessários (alguns sendo repasses do BNDES) para o financiamento de projetos que visam a promoção do desenvolvimento socioeconômico da região Sul do Brasil. 

Conforme mencionado em vídeo e também publicado pela presidente Dilma do NDB, foi planejada uma alocação da ajuda financeira em diferentes eixos:

 

Fonte: Perfil X de Dilma Rousseff. 

 

Apesar do mencionado na tabela acima, segundo a presidente do NBD, a gestão dos recursos é flexível, não havendo uma imposição de como o auxílio deve ser realocado, e dialoga de acordo com cada cenário: “a destinação dessa verba é passível de direcionamento de acordo com as urgências, prioridades e necessidades do estado do Rio Grande do Sul.” (Dilma Rousseff)

 

No entanto, após publicação de texto escrito por José Fucs no Jornal Estadão com o título “Crédito do NDB para o RS, anunciado por Dilma como um feito seu, foi aprovado no governo Bolsonaro”, o anúncio oficial do recurso para o RS foi alvo de críticas propagadas pela extrema direita. A matéria  afirmou que quatro das seis operações já haviam sido aprovadas pelo NBD na gestão anterior à de Dilma através de projetos distintos.

 

Ressalta-se que a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal do Brasil é a responsável pelo processo de autorização de empréstimos internacionais. Dessa forma, além da aprovação do NDB sobre o crédito, é necessário que o Senado brasileiro faça todo o trâmite de aceitação da operação financeira para que o tomador tenha acesso ao montante. Posto isso, de fato, conforme o site do NDB, uma parte do crédito fora aprovada pela instituição (NBD) durante o governo Bolsonaro via diferentes projetos. Contudo, apenas no fim de 2023, já durante o governo Lula, que a CAE efetuou a autorização, nesse caso do valor de US$1,2 bilhões para 2º Programa BNDES-NDB para Infraestrutura Sustentável e Apoio aos Entes Subnacionais mencionado por José Fucs e negociado em 2020. Em 2023 também foi aprovado US$1 bilhão para Programa Emergencial de Acesso a Crédito – FGI do BNDES (semelhante a um programa que fora consentido em 2020).

 

Portanto, uma parte do total negociado entre 2020 e 2022 foi realocado para auxílio à emergência no Rio Grande do Sul. Porém, apenas cerca de US$ 145 milhões para o BRDE foram autorizados pelo Senado no período mencionado – e portanto, poderiam ser atribuídos à gestão Bolsonaro. O restante, embora negociado entre as partes no mandato anterior e já aceito pelo NDB, veio receber aprovação do Senado apenas em 2023. Além disso, vale ressaltar que uma vez aprovado o recebimento dos recursos na CAE, caberá ao tomador nacional (sendo um deles o BNDES) articular sua distribuição para projetos internos, o que não é uma tarefa meramente técnica, mas também política de selecionar as melhores oportunidades para o atendimento aos interesses de desenvolvimento nacional. 

Referências

 

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. O Banco de desenvolvimento do Brasil. Disponível em: https://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Hotsites/Relatorio_Anual_2014/banco_desenvolvimento.html. Acesso em: 10 de jul. de 2024. 

 

BELASQUES, Bruna; CASTRO, Bruno; CARNEIRO, Gabriel; ABRÃO, Rafael; DOS SANTOS, Vitor Hugo; SOUSA, A. T. L. M. O Brasil diante do BRICS e do Novo Banco de Desenvolvimento. Observatório de Política Externa e da Inserção Internacional do Brasil, OPEB. 20 de set. 2020. Disponível em: https://opeb.org/2020/09/19/o-brasil-diante-do-brics-e-do-novo-banco-de-desenvolvimento/. Acesso em: 12 de jul. 2024.

 

BISCHOFF, Wesley; VIGGIANO, Giuliana. Em sessão do G7, Lula defende reforma no Conselho de Segurança da ONU e critica ‘blocos antagônicos’. G1. 10 de mai. de 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/05/20/em-sessao-do-g7-lula-reforca-agenda-2030-e-defende-reforma-no-conselho-de-seguranca-da-onu.ghtml. Acesso em: 12 de jul. 2024.

 

Comissão de Assuntos Econômicos. Senado Federal. 

 

COSTA, Carlos Eduardo. 2939 Considerações sobre o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD). Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Brasília, outubro de 2023. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/12472/1/TD_2939_Web.pdf. Acesso em: 12 de jul. 2024.

 

FUCS, José. Crédito do NDB para o RS, anunciado por Dilma como um feito seu, foi aprovado no governo Bolsonaro. Estadão, 16 de mai. de 2024. Disponível em: https://www.estadao.com.br/economia/jose-fucs/credito-do-ndb-para-o-rs-anunciado-por-dilma-como-um-feito-seu-foi-aprovado-no-governo-bolsonaro/. Acesso em: 10 de jul. de 2024.  

 

G1 Rio Grande do Sul. Mais de 2,1 milhões de pessoas foram afetadas pelo temporal no RS; 618 mil estão fora de casa. 11 de mai. de 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2024/05/11/mais-de-21-milhoes-de-pessoas-foram-afetadas-pelo-temporal-no-rs-618-mil-estao-fora-de-casa.ghtml. Acesso em: 10 de jul. de 2024. 

 

NBD, Novo Banco de Desenvolvimento. Investor Presentation. fev de 2024. Disponível em: https://www.ndb.int/wp-content/uploads/2023/10/Investor-Presentation-Q1_2024-NDB.pdf. Acesso em: 12 de jul. 2024.

 

NBD, Novo Banco de Desenvolvimento. NDB committed to provide up to USD 10 billion for the crisis-related Emergency Assistance Facility, including support for member countries’ economic recovery, in a fast-track process. 2020. Disponível em: https://www.ndb.int/annual-report-2020/covid-19.html#:~:text=NDB%20committed%20to%20provide%20up,in%20a%20fast%2Dtrack%20process.  Acesso em: 21 de jul. 2024.

 

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Rousseff, Dilma. Quero anunciar a liberação de US$  1,115 bilhão… 14 mai. de 2024. Twitter: @dilmabr. Disponível em: https://x.com/dilmabr/status/1790376839761874969/video/1. Acesso em: 10 de jul. de 2024. 

 

Rousseff, Dilma. NBD vai destinar R$ 5,750 bilhões para o Rio Grande do Sul… 14 mai. de 2024. Twitter: @dilmabr. Disponível em: https://x.com/dilmabr/status/1790376839761874969/video/1. Acesso em: 10 de jul. de 2024. 

 

STÉDILE, Miguel. Lula e o protagonismo reivindicado pelo Sul Global. Brasil de Fato. 11 de mar. 2024. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2024/03/11/lula-e-o-protagonismo-reivindicado-pelo-sul-global. Acesso em: 12 de jul. 2024.

 

VIDAL, Iara. Na China, Alckmin e Dilma anunciam investimentos de mais de 5 bilhões no Rio Grande do Sul. Revista Fórum. 5 de jun. de 2024. Disponível em: https://revistaforum.com.br/politica/2024/6/5/na-china-alckmin-dilma-anunciam-investimentos-de-mais-de-bilhes-no-rio-grande-do-sul-159966.html. Acesso em: 10 de jul. de 2024. 

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